É curioso como os seres humanos podem ser verdadeiros mestres da comunicação no dia a dia com amigos e familiares, mas terríveis no contexto corporativo.
Parece que toda a habilidade que usamos para nos comunicar em grupos pequenos simplesmente não funcionam em grupos maiores de pessoas, especialmente quando se envolve diferentes canais e estilos de comunicação.
Quem nunca recebeu uma mensagem no WhatsApp e precisou de alguns minutos até conseguir interpretar o que a pessoa quis dizer? Ou descobriu, dias depois, que um colega entendeu errado o que você quis dizer e acabou fazendo um trabalho desnecessário?
Não faltam exemplos de falhas de comunicação nesse sentido. Estima-se que só nos Estados Unidos as empresas perdem, anualmente, mais de 1 trilhão de dólares por falhas simples de comunicação.
Poderíamos escrever milhares e milhares de linhas sobre teorias do porquê isso acontece – da teoria da informação de Claude Shannon ao número de Dunbar – mas além de pessoas muito mais qualificadas já terem feito isso ao longo da história, tais explicações teóricas são difíceis de serem traduzidas para a vida prática.
Por isso, neste texto vou dar algumas dicas para tornar a troca de informações dentro de sua empresa mais fluída e aproveitar a oportunidade para esclarecer que, ao contrário de que muitas pessoas pensam, sistematizar a comunicação abre espaço para a aleatoriedade necessária para a serendipidade dentro das empresas.
Como desenvolver um plano de comunicação efetivo
Em primeiro lugar, precisamos entender que toda comunicação consiste de alguns elementos:
- Emissor: É quem envia a mensagem e mais precisa seguir o plano de comunicação. A responsabilidade da qualidade da mensagem deve ser sempre do emissor.
- Receptor: É quem recebe a mensagem e deve transformá-la em alguma ação – seja apenas responder, encaminhar ou planejar uma tarefa a partir da informação recebida.
- Transformador: É o meio onde a mensagem vai transitar (tecnologia). Quanto menos atrito tem um transformar, mais ágil é a mensagem.
- Mensagem: São as informações que transitam nesse sistema. Importante ressaltar que a mensagem não se limita a texto – pode ser vídeo, um áudio no WhatsApp ou até uma reação nas redes sociais.
- Barulho: Pode acontecer em qualquer momento e o papel do gestor é entender como reduzir ao máximo. Exemplos comuns de barulho são erros de português, textos escritos sem nexo, problemas técnicos e interpretações erradas.
Se tudo isso parece complicado demais, não se preocupe.
Você só precisa entender que quando alguém envia uma mensagem, essa mensagem é transformada pelo meio no qual ela é enviada para que o receptor consiga compreendê-la.
Neste caminho, sua mensagem está sujeita às interferências e perdas (barulho) e um bom gestor assume a missão de reduzí-los com efetividade.
Sabendo disso, na hora de desenvolver um plano de comunicação para seu time, é importante considerar e determinar esses cinco elementos, de uma forma que fique claro para as pessoas como as informações devem fluir.
Comunicação assíncrona vai mudar a sua vida
Uma boa prática que não se encaixa em nenhum dos elementos de um plano de comunicação mas certamente permeia todo ele é adotar a comunicação assíncrona para mensagens – especialmente no WhatsApp.
Sabe por que você passa mais tempo respondendo mensagens do que executando aquilo que você é bom em fazer?
Porque o WhatsApp hoje em dia nada mais é do que um lista de tarefas onde qualquer pessoa com o seu número pode colocar uma tarefa lá.
E não espere que isso vá mudar… Quem vai precisar colocar esse limite é você – como dizem por aí, se você não priorizar o seu tempo, alguém vai fazer por você.
Algumas dicas práticas:
– Nunca trabalhe com uma segunda tela com o WhatsApp aberto (a não ser que você trabalhe com atendimento e a velocidade de resposta seja seu indicador de performance).
– Responda em blocos ao longo do dia. Ao invés de ficar respondendo em tempo real, como se fosse um chat, deixa as mensagens acumularem por um determinado tempo (eu faço 2h) e depois responda todo mundo. Repita o processo 3x ou 4x ao longo do dia.
– Seja claro e objetivo nas respostas, e exija que as pessoas façam o mesmo nas perguntas – comunicação assíncrona é a alma do negócio e vai mudar a sua vida, acredita em mim.
– Informe as pessoas mais importantes que, se houver alguma urgência, elas podem te ligar. Assim você não vive ansioso de que pode ter alguma coisa “pegando fogo” e você não está dando atenção.
– Você não precisa obrigar as pessoas a não enviarem mensagens em certos horários, mas você pode responder apenas nos horários que você está de fato trabalhando – aos poucos elas vão entender isso e vai ficar tudo bem.
Dica de ouro para comunicação em times remotos
Sabemos que a maior parte de nossa comunicação é não-verbal – ou seja, interpretamos as pessoas mais pelos gestos. expressões faciais e postura do que pelo o que elas dizem.
Além disso, no trabalho remoto não VEMOS o que cada pessoa está fazendo.
Num escritório físico, se você pede para uma pessoa buscar uma informação e então você vê ela indo perguntar outras pessoas, você está ciente de que ela ouviu você e está agindo em cima disso.
No trabalho remoto, se você não avisa que vai buscar, quem mandou a mensagem não tem essa clareza, o que pode causar uma série de confusões e ansiedade no time.
Por isso é importante SEMPRE dar um retorno. Nem que seja um “joinha” no WhatsApp, oriente seu time a sempre confirmar que uma mensagem foi lida e compreendida.
Relação entre comunicação e cultura
É impossível falar de comunicação sem levar em consideração os elementos culturais de cada grupo. Afinal, a cultura nada mais é um conjunto de padrões comportamentais que caracterizam um determinado grupo de pessoas.
Na prática isso significa que nada adianta criar um plano de comunicação determinando que toda mensagem precisa ser assíncrona, culturalmente, as pessoas da sua empresa têm medo de ser direto ao ponto e parecer arrogante.
Outro exemplo comum de desalinhamento é afirmar que feedbacks são bem-vindos, mas punir (ou até se mostrar reativo) quando alguém fornece um feedback que você não concorda.
Em situações como esta, resta usar o bom o senso e conhecimento sobre o seu time para determinar se o plano de comunicação será um motor para mudança de cultura ou não – e se sim, qual tipo de apoio dos principais stakeholders o plano vai receber em momentos de resistência.
Como qualquer outro aspecto do negócio, a cultura se constrói e é mantida muito mais do que está escrito na parede, mas pelas ações e rituais.
Porque sistematizar a comunicação na sua empresa (se conduzido corretamente) não vai matar a criatividade do time
Olhar para a comunicação da sua empresa de uma forma mais sistemática não requer eliminar totalmente o acaso – as conversas no corredor, a troca de ideias, os happy hours….
Muito pelo contrário! Olhar para a comunicação dessa forma permite que seu time tenha tempo e energia para fazer coisas além do operacional.
É muito mais provável que ideias surjam em ambientes onde existe tempo (e saúde mental) para isso do que em ambientes onde está todo mundo, em todo momento, apagando incêndios.
Como disse Jocko Willink, um dos influenciadores de negócio e desenvolvimento pessoal mais influentes do mundo, “disciplina é igual a liberdade”.